Vergílio Ferreira
Filho de António Augusto Ferreira e Josefa Ferreira. Em 1920, os pais de Vergílio Ferreira emigram para os Estados Unidos, deixando-o, com seus irmãos, ao cuidado de suas tias maternas. Esta dolorosa separação é descrita em Nitido Nulo. A neve - que virá a ser um dos elementos fundamentais do seu imaginário romanesco é o pano de fundo da infância e adolescência passadas na zona da Serra da Estrela. Aos 10 anos, após uma peregrinação a Lourdes, entra no seminário do Fundão, que frequentará durante seis anos. Esta vivência será o tema central de Manhã Submersa.
Em 1932, deixa o seminário e acaba o Curso Liceal no Liceu da Guarda. Começa a dedicar-se à poesia. Entra para a Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, continuando a dedicar-se à poesia, nunca publicada, salvo alguns versos lembrados em Conta-Corrente e, em 1939, escreve o seu primeiro romance, O Caminho Fica Longe. Licenciou-se em Filologia Clássica em 1940. Conclui o Estágio no Liceu D.João III (1942), em Coimbra. Começa a leccionar em Faro. Publica o ensaio "Teria Camões lido Platão?" e, durante as férias, em Melo, escreve "Onde Tudo Foi Morrendo". Em 1944, passa a leccionar no Liceu de Bragança, publica "Onde Tudo Foi Morrendo" e escreve "Vagão "J"". Vergílio Ferreira morre em Lisboa, a 1 de Março de 1966 e é sepultado em Melo.
Em 1932, deixa o seminário e acaba o Curso Liceal no Liceu da Guarda. Começa a dedicar-se à poesia. Entra para a Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, continuando a dedicar-se à poesia, nunca publicada, salvo alguns versos lembrados em Conta-Corrente e, em 1939, escreve o seu primeiro romance, O Caminho Fica Longe. Licenciou-se em Filologia Clássica em 1940. Conclui o Estágio no Liceu D.João III (1942), em Coimbra. Começa a leccionar em Faro. Publica o ensaio "Teria Camões lido Platão?" e, durante as férias, em Melo, escreve "Onde Tudo Foi Morrendo". Em 1944, passa a leccionar no Liceu de Bragança, publica "Onde Tudo Foi Morrendo" e escreve "Vagão "J"". Vergílio Ferreira morre em Lisboa, a 1 de Março de 1966 e é sepultado em Melo.
Fonte Wikipédia
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Nítido nulo
[...]
AGORA a praia está deserta. Os últimos banhistas subiram a longa escadaria, desapareceram há dias atrás da falésia. E estranha, uma melancolia cresce como erva, deixa um rasto nas coisas. Memória do que morreu, subtil, do que vibrou – e a indiferença da terra, da luz. Do mar. Ou talvez que tudo nasça da certeza do meu fim. Condenado à morte – quando me executarão? – estou aqui à espera nesta prisão junto à praia. Na realidade, não é uma prisão – um posto da guarda? No extremo da baía há um fortim, meteram-me aí. A sala é larga e limpa. As próprias grades são pintadas de branco para deixarem passar a alegria que puderem. Decerto entendeu-se que sofria mais assim. Ou quiseram homenagear-me? Porque lá fora glorificam-me ou àquela parte de mim que lhes convém e incluiram no seu álbum de família. Um condenado, aliás, homenageia-se sempre. Mesmo que se lhe cuspa na cara – mas é difícil explicar agora. É uma forma plausível de o afastarmos de nós e à imagem que vem nele da nossa própria morte. Ou uma forma prévia de se aplacar o remorso. Sou em breve em mim o nada deles amanhã, cobrem-me de gulodice, é assim. Todas as vontades, todos os caprichos – quando me executarão? E no entanto, esta mesma incerteza, esta possibilidade de que daqui a um mês, daqui a um minuto. Estou calmo. Ou não? Estou calmo. A vida existe. O sol. Realizei o meu destino até onde me falava – que é que pode sofrer em mim? Sento-me às grades, olho. A areia branca estende-se até quase a perder de vista, os meus olhos tremem à luz. Luz suspensa, brilha no ar. Sinto-a nas pupilas como pequenos estalidos. Ao longo da praia o mar bate na areia em breves ondas de espuma. É um mar de brinquedo e as crianças sabem-no. Metem-se com ele como com um cão velho, ele deixa – de quando estou a falar? Os últimos banhistas desapareceram atrás das arribas, agora estou só. Atrás de mim está um guarda. Vejo-o oblìquamente, vejo-o só de pensar nele, está imóvel junto da porta – que estará pensando? Tem ordens terminantes para me obedecer em tudo, fiscalizar em tudo. Instantâneo, coordena-se ao mais breve gesto meu, a um movimento, palavra. Mas não me movo, estou calado. Estendo é os olhos pela praia até os desfazer na neblina, que está ao fundo, e nas grandes rochas que avultam dentro dela e fecham a baía. Sùbitamente despovoada, ficou-me dela o eco da excitação, da alegria marítima. Estou cheio ainda da memória dos banhistas, que é sobretudo delas, memória difícil. Corpos de mulheres. Fecundo terno violento – um corpo. E a dificuldade das noites. Depois, o silêncio a toda a extensão da areia, alguns bancos, a estacaria dos toldos ao sol, é o fim da estação.
AGORA a praia está deserta. Os últimos banhistas subiram a longa escadaria, desapareceram há dias atrás da falésia. E estranha, uma melancolia cresce como erva, deixa um rasto nas coisas. Memória do que morreu, subtil, do que vibrou – e a indiferença da terra, da luz. Do mar. Ou talvez que tudo nasça da certeza do meu fim. Condenado à morte – quando me executarão? – estou aqui à espera nesta prisão junto à praia. Na realidade, não é uma prisão – um posto da guarda? No extremo da baía há um fortim, meteram-me aí. A sala é larga e limpa. As próprias grades são pintadas de branco para deixarem passar a alegria que puderem. Decerto entendeu-se que sofria mais assim. Ou quiseram homenagear-me? Porque lá fora glorificam-me ou àquela parte de mim que lhes convém e incluiram no seu álbum de família. Um condenado, aliás, homenageia-se sempre. Mesmo que se lhe cuspa na cara – mas é difícil explicar agora. É uma forma plausível de o afastarmos de nós e à imagem que vem nele da nossa própria morte. Ou uma forma prévia de se aplacar o remorso. Sou em breve em mim o nada deles amanhã, cobrem-me de gulodice, é assim. Todas as vontades, todos os caprichos – quando me executarão? E no entanto, esta mesma incerteza, esta possibilidade de que daqui a um mês, daqui a um minuto. Estou calmo. Ou não? Estou calmo. A vida existe. O sol. Realizei o meu destino até onde me falava – que é que pode sofrer em mim? Sento-me às grades, olho. A areia branca estende-se até quase a perder de vista, os meus olhos tremem à luz. Luz suspensa, brilha no ar. Sinto-a nas pupilas como pequenos estalidos. Ao longo da praia o mar bate na areia em breves ondas de espuma. É um mar de brinquedo e as crianças sabem-no. Metem-se com ele como com um cão velho, ele deixa – de quando estou a falar? Os últimos banhistas desapareceram atrás das arribas, agora estou só. Atrás de mim está um guarda. Vejo-o oblìquamente, vejo-o só de pensar nele, está imóvel junto da porta – que estará pensando? Tem ordens terminantes para me obedecer em tudo, fiscalizar em tudo. Instantâneo, coordena-se ao mais breve gesto meu, a um movimento, palavra. Mas não me movo, estou calado. Estendo é os olhos pela praia até os desfazer na neblina, que está ao fundo, e nas grandes rochas que avultam dentro dela e fecham a baía. Sùbitamente despovoada, ficou-me dela o eco da excitação, da alegria marítima. Estou cheio ainda da memória dos banhistas, que é sobretudo delas, memória difícil. Corpos de mulheres. Fecundo terno violento – um corpo. E a dificuldade das noites. Depois, o silêncio a toda a extensão da areia, alguns bancos, a estacaria dos toldos ao sol, é o fim da estação.
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Excerto da obra “Nítido nulo” de Vergílio Ferreira
2 Comments:
Passei por aqui e fiquei triste por não haver actualizações ...
By Nothingandall, at 4:19 da tarde
...traigo
sangre
de
la
tarde
herida
en
la
mano
y
una
vela
de
mi
corazón
para
invitarte
y
darte
este
alma
que
viene
para
compartir
contigo
tu
bello
blog
con
un
ramillete
de
oro
y
claveles
dentro...
desde mis
HORAS ROTAS
Y AULA DE PAZ
TE SIGO TU BLOG
CON saludos de la luna al
reflejarse en el mar de la
poesía...
AFECTUOSAMENTE
MYTOS
ESPERO SEAN DE VUESTRO AGRADO EL POST POETIZADO DE ENEMIGO A LAS PUERTAS, CACHORRO, FANTASMA DE LA OPERA, BLADE RUUNER Y CHOCOLATE.
José
Ramón...
By Jose Ramon Santana Vazquez, at 10:34 da tarde
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