Antero de Quental
Tese e Antítese
I
Já não sei o que vale a nova ideia,
Quando a vejo nas ruas desgrenhada,
Torva no aspecto, à luz da barricada,
Como bacante após lúbrica ceia!
Sanguinolento o olhar se lhe incedeia...
Respira fumo e fogo embriaga...
A deusa de alma vasta e sossega
Ei-la presa das fúrias de Medeia!
Um século irritado e truculento
Chama à epilepsia pensamento,
Verbo ao estampido de pelouro e obus...
Mas a ideia é num mundo inalterável,
Num cristalino Céu, que vive estável...
Tu, pensamento, não és fogo, és luz!
II
Num Céu intemerato e cristalino
Pode habitar talvez um Deus distante,
Vendo passar em sonho cambiante
O Ser, como espectáculo divino:
Mas o homem, na terra onde o destino
O lançou, vive e agita-se incessante...
enche o ar da terra o seu pulmão possante...
Cá da terra blasfema ou ergue um hino...
A ideia encarna em peitos que palpitam:
O seu pulsar são chamas que crepitam,
Paixões ardentes como vivos sóis!
Combatei pois na terra árida e bruta,
Té que a revolva o remoinhar da luta,
Té que fecunde o sangue dos heróis.
Antero de Quental
Poeta e pensador português.
Comemorando o nascimento do poeta a 18 de Abril de 1842 (m. 11 de Setembro de 1881).
Os Poetas são eternos.
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